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quinta-feira, 17 de maio de 2012

O mistério dos significados.




Lá em Minas Gerais existem algumas expressões que soam como "deseducadas". Exemplo disso é a palavra "chouriço". Ela é usada como resposta àquelas perguntas as quais não queremos responder. O outro nos pergunta: "O que é isso?". E rapidamente respondemos: "Chouriço". Pronto, mostramos que a pergunta não nos agradou. Na verdade, dizer chouriço é uma forma velada de anunciar: "Não é da sua conta, sai pra lá seu bicudo, que eu não lhe devo satisfações!".

Portanto, além de ser linguiça de sangue cozido, em Minas Gerais, a palavra "chouriço" também adquiriu um tom de afronta e revela a má criação daquele que a utiliza como resposta.

Só que existem situações em que o chouriço é chouriço mesmo! E assim se deu com minha mãe. Quando criança, em virtude da difícil situação financeira de sua família, minha avó fazia minha mãe sair pelas ruas da cidade com um balaio nos braços, vendendo os mais diversos produtos caseiros. O mais comum era o sabão de bola feito de coalho.

Mas, num belo dia, o conteúdo do balaio era tal chouriço feito pela minha avó. Foi aí que um senhor abordou perguntando: "Que que cê tá vendendo aí menina?". Minha mãe prontamente respondeu: "Chouriço!". "Mal-educada, sua mãe não te deu educação não?", retrucou o velho. Assustada, minha mãe respondeu medrosa: "É chouriço mesmo, moço!". E, destampando o balaio, mostrou ao velho o seu conteúdo.

Coisas como essas me fazem pensar nos mistérios dos códigos de linguagem humana. Uma mesma palavra pode ter os mais diversos significados. Tudo depende do lugar e da forma como é empregada.

Em Portugal, por exemplo, a palavra "bicha" também significa fila. Portando, dizer que vai ter de enfrentar uma bicha para pagar uma conta no banco não significa nenhum problema aos nossos irmãos lusitanos. Já aqui no Brasil, fica muito complicado dizer isso, afinal às cabeças maldosas já iriam imaginar coisas horríveis daquele segurança que fica parada na porta do banco!

Se chegar a Porto Alegre e disser numa padaria que você quer uma torrada, em poucos minutos lhe servirão aquilo que chamamos de misto-quente. Já em outros lugares se pedir uma torrada, você receberá uma fatia de pão com aspecto de cadáver. Torrada é um pão morto. Tenhamos coragem de reconhecer. Torrada é uma coisa sem graça que só desce sob ameaça cardiologistas, endocrinologistas e outros "istas" que temos por aí.

Misterioso mundo das palavras. Você já imaginou se alguém chegasse para você e gritasse, olhando nos seus olhos, a palavra "merda"? Pois é, certamente você ficaria ofendidíssimo! Mas no mundo do teatro, isso é o mesmo que dizer: "Boa sorte"!

Não sei. O que sei é que chouriço nem sempre é chouriço, torrada nem sempre é torrada e bicha nem sempre é bicha. Tudo depende do contexto!

Também o sentimento humano é como as palavras. É que nem sempre a palavra pronunciada é coerente com o sentido mais profundo que a motivou. Nisto está a falsidade: Usar a palavra fora do contexto do sentimento. Essa desarticulação gera a mentira, faz brotar a dúvida e a insegurança nas relações. É o mesmo que bater na cara com o intuito de dizer que se ama.

Mais fácil seria revelar o amor por meio do beijo, porque assim cessaria a desarticulação das realidades.

Mas o beijo de Judas não representou uma traição? Pois é, mas o que se seguiu foi pior ainda: O suicídio por enforcamento significou o arrependimento. Na verdade, o que estou precisando mesmo é tirar "água do joelho", mas os dois banheiros do avião estão ocupados. Em um deles tem uma mocinha que entrou a mais de meia hora. Deve estar passando um "fax"! E no outro, não da para encarar a "bicha" enorme na porta!


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